Acreditar
vanita
Eu tinha 20 anos mas é como se fosse hoje. De pé, no decorrer da cerimónia eucarística da Páscoa, enchi-me de indignação e descrença. Naquele momento, sei precisamente qual é, tudo deixou de fazer sentido e isolei um grito surdo na minha cabeça. Como é que tanta gente se ajoelhava numa tão grande e óbvia patranha? Foi mais forte do eu. Não sobrou uma réstia do que se chama fé e nunca mais consegui anunciar-me como cristã, comungar ou celebrar de forma ativa e "praticante" os ritos da religião onde cresci e fui educada. Não cai nessa fossa de fingir uma dedicação que não existe, ao menos isso, tão pouco me revoltei. Não me tornei apática. Distanciei-me e aceitei que o meu caminho não passava por ali. Também não tive pudor em, plenamente consciente, voltar como mera visitante ou espectadora em situações esporádicas e festivas. Tem sido assim até agora. Com duas notas dignas de serem assinaladas. No fatídico 16 de maio de há 16 anos, quando entrei numa igreja para pedir ajuda a Deus, eu com 27 anos e um papel a dizer tumor carcinóide numa mão, e durante a pandemia, depois do que achava eu ser todo o mal ter acontecido, quando acendi três velas em Fátima, cheia de boa vontade e intenção. Os piores dias de sempre não tardaram a chegar e a desilusão com a falta de atendimento às minhas preçes, apesar de intensa, foi breve breve. Não esperava mais, é pena. Mas Deus escreve por linhas tortas, dizem. Não sei se têm razão, mas hoje acredito que sim. E estou tão agradecida.