O silêncio é de ouro #2
vanita
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Está bom assim. Não mexe mais. Nunca mais.
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Há qualquer coisa de indescritível nos rostos dos familiares das vítimas da queda do avião nos Alpes. Não sabemos explicar, mas aquelas expressões, as rugas e os trejeitos, os movimentos e a postura dos corpos, aproximam-nos de forma dolorosa do horror que se apodera de quem descobre que algo mudou para sempre. Inevitavelmente. As chegadas dos aeroportos são espaços de felicidade e reencontro. Nunca estamos preparados para receber a pior das notícias enquanto aguardamos os nossos entes queridos. A passagem de uma emoção à outra fica marcada como ferro em brasa. E arrepia-nos, até a nós, que nada temos em comum com aquelas pessoas em particular. Revemo-nos na dor e reconhecemo-nos naqueles rostos. Não consigo imaginar a transfiguração que se dá quando se divulgam notícias como as que dão conta de que a queda do avião se deve ao facto de alegadamente o co-piloto se ter trancado no cockpit e de ter accionado o botão de descida a pique.
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Eu estive lá. Foi há 25 anos e a prova contou apenas com três mil participantes. Um deles era o meu pai. Os tempos eram outros, corria-se por carolice e por uma questão de saúde, não existiam todos os artefactos do running e bastavam umas sapatilhas e uns calções para se participar nas corridas que pululavam um pouco por todo o país - sim, isto não é recente. Lisboa chegou tarde, mas chegou. A prova - na altura ainda não era meia maratona, se a memória não me falha, mas os habituais 16 quilómetros que reuniam os fanáticos das corridas quase todos os fins-de-semana - tinha pouco de atractivo em relação aos grandes eventos daquele tempo, mas a ideia de passar a ponte 25 de Abril a pé foi suficiente para conquistar o grupo de amigos do meu pai. Nós, as famílias, fizemos o que sempre fazíamos. Viemos atrás, com o farnel na bagageira, para dar apoio e piquenicar por aí, como era hábito. Correu mal, correu muito mal. E isto é coisa que pouco sabem, menos ainda se lembram. Lisboa nunca tinha organizado uma corrida e não estava preparada para dar vazão quer nos abastecimentos quer na enchente que se gerou na meta, à chegada dos participantes. Criou-se um tumulto e uma confusão de que não há memória - resta a minha e a dos que, como eu, assistiram a tudo. A multidão acumulou-se à chegada e - meu deus! - as entregas dos prémios de participação não estavam a dar escoamento aos corredores. E havia chocolates que não estavam a ser entregues aos justos vencedores. Esta é a minha memória mais dolorosa, confesso. Em segundos - foi o que me pareceu - havia pessoas em cima da carrinha de distribuição e tudo se descontrolou. Agarraram nas caixas de chocolates e foi uma festa: nós crianças fomos as mais beneficiadas. Chocolates para todos. Mas tivemos de sair a correr, que a coisa não estava para grandes amizades. Foi um verdadeiro desastre e esta é a história que ficará para sempre. Felizmente, a partir da segunda edição, tudo mudou. Para melhor.
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