Assim mesmo, em caixa baixa. A insuportável vaidade. O cabelo, as bocas fechadas e tensas de prisão de ventre, a postura ensaiada, sem margem para a espontaneidade. O cabelo, os sapatos, as unhas, os casacos. Não há cu para a vaidade vazia. Para a ausência de personalidade fechada em amargas posturas semi-intelectuais. São balões de ar que não explodem e enchem mais espaço do que deviam. Espampanantes, exuberantes e sem sentido. O detestável elefante na sala de porcelana, que dá voz à metáfora mais gasta de quem não encontra - será que consegue? - palavras para se explicar. Porque a vaidade, a irritante vaidade, ocupa demasiado espaço. À distância de um alfinete.
Esclareçam-me lá. Um jornalista não pode fazer publicidade ou associar-se a marcas mas, se for na qualidade de blogger, não há problema? É como aquilo de chamar palhaço ao Cavaco Silva? Isto é tão 2013, confesso que me sinto perdida nesta regras inventadas ao sabor do que dá mais jeito.
Chama-se Daily Cristina e foi apresentado ao público com pompa e circunstância, jornalistas, produções fotográficas e muitos elogios à mistura. É uma loja nova? Não, é um blog pessoal e íntimo de uma apresentadora de televisão em Portugal. Vá, íntimo para quem quiser acreditar nisso. Há quem migre blogs para domínios de nome próprio na Internet, há até quem o faça aos pares, promovendo uma relação que devia ser pessoal mas quem tem um cunho público, muito pouco privado. Há quem escreva livros, há quem peça aos leitores para dar o mote para os escrever, há quem promova passatempos, votações, concursos e charadas e muitos, muitos cliques com partilhas de textos e opiniões para responder aos requisitos que, não raras vezes, dão origem a reportagens na imprensa nacional, que isto o mundo é muito pequeno e toda a gente conhece alguém que pode sempre dar um jeitinho. Fala-se de tudo, elogia-se, eleva-se ao patamar de extraordinário e, espremido, pouco mais sobra do que uma vontade quase doentia de ser alguém, de ganhar dinheiro, de ter poder e, inacreditavelmente, de ser uma referência, um opinion maker, uma criatura que sabe mais do que quem a rodeia. Trocam-se links e ligações como moeda de negócio, na ilusão de chegar a esse ansiado patamar. E a espontaneidade, a vontade de discutir ideias e opiniões? Essa voa ao sabor de públicos-alvo, devidamente catalogados que isto nunca se sabe quando é que a pode imprimir uma t-shirt, marcar uns jantares e, através dos patrocínios, gerar mais uma fonte de receitas. Estragámo-nos a troco de nada. Somos cada vez mais vazios. Mas somo-lo com purpurinas e muito glamour. Onde é que estão os flashes? O que acabei de escrever prova que tenho neurónios!
Há minha frente um casal de 60 anos almoça com uma senhora de cerca de 40. Claramente debilitada, magra e com aura de infelicidade, a companhia do casal nunca abre a boca ou, se o faz, mal se ouve. Mas o chefe de família fá-lo com convicção por duas vezes. Da primeira pergunta se o prato que a senhora de 40 está a comer é saboroso, porque tem bom aspecto. Quando ouvimos a sua voz pela segunda vez, diz, com voz firme de comandante enternecido: tens companhia para almoçar, tens companhia para ir ao teatro, tens companhia para ir ao cinema. Não sei a história que os une, mas sei que a levam ao colo. A esta senhora, que mal consegue levar a colher à boca.