Quando tenho uma pequena percepção, um vislumbre ainda que momentâneo, da imagem que os outros têm de mim. Sei que não a posso mudar, felizmente já não me angustia tanto como quando era mais nova. Também sei que essa imagem que me aterroriza, por ser cheia de ideias formatadas que não permitem qualquer modificação, apesar de poder ser extensiva a um número maior de pessoas do que gosto de imaginar, resulta de falta de conhecimento. Isso mesmo. Quanto mais conhecemos os outros, melhor compreendemos as suas razões e atitudes. Quando assim é, as gavetas desaparecem, dando lugar a formas de estar motivadas por personalidades com que temos mais ou menos afinidade mas que entendemos ser fruto de uma maior complexidade. Fiz-me entender? Talvez não.
Sinto saudades de deixar as mãos deslizar pelo teclado para dar forma e cor a cenas que perscrutei com alma de repórter. De deixar que o texto respire, sendo eu apenas o veículo do que observei, escutei e permiti que se moldasse ao meu jeito de sentir o Mundo. Pensei que tinha morrido em mim, afinal, ainda cá anda.
Acabei de perceber que uma blogger que muitos seguem - seguiam - morreu depois de uma luta corajosa contra o cancro. Merda de doença esta que não dá tréguas e causa tanto sofrimento. Tão triste.
Eu não sabia, não podia saber, mas naquele dia fui salva. Quando a cólica me deitou ao chão em plena redacção, deu-se início a uma mudança que ainda não está completamente instalada. Hoje não sou a miúda cheia de certezas e convicções de então. Hoje não sei quem sou, sei apenas que sou diferente e, tenho quase a certeza, também sou melhor. Mudei, mudei muito. Mas penso que não temos alternativa quando somos diagnosticados com uma doença tão cruel, mesmo quando se tem a sorte de não passar disso. De um diagnóstico que todos os exames e consultas negam ao longo dos anos. E é isso que é impressionante. Os anos. Anos traduzem passagem de tempo, que é tudo o que nos é tirado quando ouvimos aquela palavra da boca de um médico. Sei que, por isso, sou afortunada. Por muito de mal que aconteça, tento não me esquecer. São sete anos. Sete anos de vida.