09
Ago14
Reis e Rainhas Disto Tudo, tenham lá calma!
vanita
As gerações pós-25 de Abril foram privilegiadas. Ao contrário das anteriores, as gerações que se seguiram à Revolução de 74 foram levadas ao colo, símbolo da esperança de um País moribundo, tacanho e que vivia há demasiado tempo na obscuridade. Sem o estigma da guerra, que ceifou tantos sonhos a pais e filhos e avós, cada um dos novos representantes encerra em si o secreto desejo de triunfo e revolução pessoal. Cada um de nós, que nascemos no advento do novo tempo, cresceu com a convicção de que é especial. Aos nossos sonhos e ambições, somam-se os sonhos e ambições amputados de pais e avós. A nossa realização é a realização de quem toda a vida se viu provido de asas pelo Estado em que estávamos. Meninos e meninas prodígio, bem ou mal, cumprimos os desígnios de quem nos eleva ao estatuto de Reis e Rainhas Disto Tudo. A cada pequena conquista, sucedem-se os aplausos e ovações de admiração e respeito. Válidos e merecidos, são também reflexo de toda a História que carregamos aos ombros e devemos ter o discernimento para o reconhecer e, por isso mesmo, saber relativá-lo. E é exactamente aqui que peço calma, excelentíssimos senhores. Sim, é verdade. Somos todos únicos e especiais e temos ideias brilhantes que nunca passaram pela cabeça de qualquer outro ser pensante, as nossas capacidades estão sempre acima das dos seres que nos rodeiam e temos todos uma estrelinha que brilha mais longe. Somos feitos desse material, está reconhecido nos genes e não há como o contrariar. Ninguém fala como nós, a nossa mestria para escrever não pode ser igualada, os génios da matemática ficariam envergonhados perante os nossos raciocínios lógicos e todas, mas mesmo todas as nossas acções são dignas de Óscares, Pulitzers e Prémios Nobel. Mas vamos lá descer à Terra e pousar os pés no chão. O Mundo é demasiado grande para tantos génios da lâmpada. Não há mal em querermos ser melhores e lutarmos pela excelência, antes pelo contrário, mas contentemo-nos com o reinado lá de casa, o do nosso quarteirão. A humildade está subvalorizada. Saber reconhecer a mestria dos pares não nos diminui, faz-nos maiores. Por incrível que pareça, o Mundo não gira à volta do nosso umbigo. Admiti-lo é o primeiro passo. Ninguém gosta dos Reis e Rainhas Disto Tudo. Roubam-nos o protagonismo.